Comunicação não verbal: a linguagem cronêmica

INTRODUÇÃO


Saudações, caros leitores. Dando continuidade às publicações, o objetivo do post desta semana é tratar um pouco sobre a comunicação não verbal, especialmente a linguagem cronêmica. Com isso, esta publicação busca tratar dos seguintes assuntos: 1. a comunicação não verbal; 2. a linguagem cronêmica; 3. exemplos e esclarecimentos.

Para isso, recorri a textos de Manusov (2016) e Mesquita (1997) para tratar da comunicação não verbal; e adotei textos de Decker (2020) e Mancera (2006) para versar sobre a linguagem cronêmica. Vejamos:


COMUNICAÇÃO NÃO VERBAL: A LINGUAGEM CRONÊMICA


Quando falamos sobre comunicação, é comum que a primeira coisa que venha à cabeça seja o tipicamente verbal. No entanto, é preciso pensar nas trocas comunicativas sob um viés da multimodal. Por exemplo, em uma conversa entre amigos, outros fatores além da comunicação verbal contribuem para o estabelecimento da significação. Aspectos como gestos, olhares, expressões faciais, entonação, toque, silêncio, entre outros, contribuem para a construção de sentidos. Desse modo, uma troca comunicacional eficaz ocorre mediante um conjunto de fatores diversos, alguns desses caracterizados como elementos não verbais.

A esse respeito, Manusov (2016, p. 1, tradução nossa) caracteriza a comunicação não verbal como “[...] tudo além da língua que usamos para nos comunicar com os outros”. Apesar de abrangente, o conceito apresentado pela autora é construtivo ao expandir as percepções relacionadas à comunicação verbal e não verbal, especialmente ao esclarecer que esse processo é composto por aspectos além do que é usualmente deduzido.

Sob um olhar mais específico, Mesquita (1997, p. 155) trata a comunicação não verbal como “[...] forma não discursiva que pode ser transmitida através de três suportes: o corpo, os objetos associados ao corpo e os produtos da habilidade humana”. Nesse sentido, dentre os diversos elementos não verbais já mencionados, é possível adicionar, também, o tempo, haja vista que se enquadra na ideia de produtos da habilidade humana.


Imagem 1: Cronêmica

Fonte: https://statics.forbesargentina.com/2022/07/crop/62d348e699389__822x822.webp


O estudo da comunicação através do tempo é chamado de linguagem cronêmica. De acordo com Decker (2020, p. 48), o termo é advindo do grégo khrónos (tempo) e foi cunhado por Thomas Bruneau no início da década de 80. A autora ainda conceitualiza a cronêmica como “[...] função comunicativa do estudo do tempo nas interações sociais e parassociais, ou seja, a maneira como as pessoas percebem, estruturam e valorizam o tempo” (Decker, 2020, p. 48). Portanto, essa forma de comunicação não verbal está relacionada com as percepções de tempo que cada indivíduo e comunidade possui e as informações que são transmitidas em decorrência disso. A fins de esclarecimento, vejamos a Imagem 2:


Imagem 2: Exemplo de cronêmica

Fonte: https://digofreitas.com/wp-content/uploads/2020/04/0162-mvdc-chegando-cedo-demais.jpg


Na tirinha apresentada, o personagem percebe que está atrasado para a festa e corre para que não chegue muito tarde ao local de destino. Ao chegar ele logo percebe que, mesmo atrasado, foi o primeiro no local. Isso comunica que, mesmo com uma administração ruim do tempo, a dos demais convidados era pior. O caso ainda pode informar que os outros indivíduos sequer queriam comparecer ao evento.

Mancera (2006) vai dividir a cronêmica em três tipos: 1. o tempo conceitual; 2. o tempo social; 3. o tempo interativo. No que se refere ao primeiro, ele está relacionado aos “hábitos, comportamentos e crenças que culturas diferentes têm em relação ao tempo” (Mancera, 2006, p. 64, tradução nossa). Por exemplo, em um país como o Brasil, devido à forte tradição judaico-cristã, a percepção de tempo é majoritariamente linear. No entanto, outros povos são adeptos de uma percepção de tempo cíclica, sem começo ou fim, apenas um loop de eventuais repetições.

A título de ilustração, as Imagens 3 e 4 são do filme A Chegada (2016), cujo conflito gira em torno de uma divergência comunicacional entre dois povos.


Imagem 3: A Chegada

Fonte: https://www.originalfilmart.com/cdn/shop/products/Arrival_2016_original_film_art_e823c6c1-6f00-42c5-9a4a-74fbd7ec83a8_5000x.jpg?v=1636660813


Imagem 4: A comunicação dos alienígenas

Fonte: https://static.wixstatic.com/media/f12b6f_55555d87812c419a98ec95a9923aaaa4~mv2.png/v1/fill/w_1000,h_563,al_c,q_90/f12b6f_55555d87812c419a98ec95a9923aaaa4~mv2.png


No filme, a trama é desenvolvida devido ao conflito linguístico entre os seres humanos e os invasores alienígenas, pois estes tinham uma comunicação diferente daqueles. No decorrer da obra, é esclarecido que, devido aos alienígenas terem uma percepção de tempo não linear, sua comunicação também ocorria através de símbolos em formatos circulares. Em vista disso, o filme é um claro exemplo de linguagem cronêmica conceitual (Mancera, 2006).

O segundo tipo destacado pela autora, o social, está relacionado às convenções que dizem respeito ao usufruto do tempo (Mancera, 2006), seja quanto a duração de eventos, reuniões, expedientes, etc. Exempli gratia, mensagens de trabalho fora do expediente se tornaram corriqueiras, especialmente com a praticidade dos aplicativos de mensagens instantâneas. Entretanto, isso não parece agradar os funcionários, visto que reclamações sobre essa prática são facilmente identificadas em redes sociais. Nesses casos, fica socialmente estabelecido que o correto é que mensagens de trabalho sejam enviadas apenas durante horário comercial, evitando conflitos. A Imagem 5 é um exemplo de publicação online que representa o que foi afirmado.


Imagem 5: Mensagem fora do horário comercial

Fonte: https://encrypted-tbn0.gstatic.com/images?q=tbn:ANd9GcQFUyBnvjivAMJ-z0GzkGo8gGG-XSL1_7J8cg&s


O terceiro tipo, o tempo interativo, “[...] contempla a maior ou menor duração dos signos de outros sistemas comunicativos[...]” (Mancera, 2006, p. 64, tradução nossa). O tempo interativo, então, está relacionado com a duração dos sons durante a enunciação de palavras, o aumento da velocidade na fala e como esses aspectos influenciam ou transformam a significação. Dentre os três destacados por Mancera (2006) este é o tipo que mais trabalha em conjunto com as demais formas de comunicação não verbal, estabelecendo inter-relações diretas.

Para uma melhor compreensão das demais formas de comunicação não verbal, segue uma lista com blogs que possam interessar:


Andreza Alcantara - Expressões faciais

Elis Rebeca - Olfática

Flaviane Carvalho - Signos e símbolos

Ludmilla da Silva - Entonação vocal

Luis Henrique - Háptica/toque

Maria Carolina - Silêncio

Mariana Oliveira - Gestos

Raimundo Nonato - Oculares

Ramon Cristian - Postura corporal

Verania Keline - Paralinguagem

Priscila Mendes - Como os sinais não verbais afetam o discurso verbal


REFERÊNCIAS:


A CHEGADA. Direção: Denis Villeneuve. Produção: Shawn Levy. Roteiro: Eric Heisserer. Estados Unidos: Paramount Pictures, 2016. Disponível em: https://www.primevideo.com/-/pt/detail/A-Chegada/0T5WZ7X538Y5CZL5RFR53CB630. Acesso em: 4 abr. 2025.


DECKER, Lygia. Teática evolutiva grupal neoparadigmática: o papel da proxêmica e da cronêmica. Interparadigmas, [s. l.], n. 8, p. 47-70, 2020. Disponível em: https://www.interparadigmas.org.br/wp-content/uploads/2022/10/Interparadigmas_Ano_08_N08_Decker.pdf. Acesso em: 28 mar. 2025. 


MANCERA, Ana Caestero. La comunicación no verbal y el estudio de su incidencia en fenómenos discursivos como la ironía. ELUA, Alicante, n. 20, p. 57-77, 2006. Disponível em: https://revistaelua.ua.es/article/view/2006-n20-la-comunicacion-no-verbal-y-el-estudio-de-su-incidencia. Acesso em: 28 mar. 2025.


MANUSOV, Valerie. Nonverbal communication. In: JENSEN, Klaus; CRAIG, Robert (ed.). The International Encyclopedia of Communication Theory and Philosophy. Washington: John Wiley & Sons, Inc., 2016. p. 1-19. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/316420752_Nonverbal_Communication. Acesso em: 4 abr. 2025.


MESQUITA, Rosa Maria. Comunicação não-verbal: relevância na atuação profissional. Revista Paulista de Educação Física, São Paulo, v. 11, n. 2, p. 155-163, 1997. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/rpef/article/view/138567. Acesso em: 4 abr. 2025.


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